O Blog Acesso, mantido pelo Instituto Votorantim, publicou recentemente uma reportagem inédita sobre o movimento da Campanha Carimbó Patrimônio Cultural Brasileiro, entrevistando lideranças e mestres do Carimbó paraense que luta para ser reconhecido como parte fundamental da nossa cultura.
A iniciativa do Blog Acesso reflete a crescente importância que a luta dos carimbozeiros paraenses vem conseguindo em âmbito nacional, sendo hoje considerado um dos principais movimentos culturais do país.
Leia abaixo a matéria na íntegra:
Reconhecimento e valorização do carimbó
Por Blog Acesso
Ao som das maracas, flautas artesanais e curimbós, grupos dançam em círculos no ritmo do carimbó. As moças giram as saias e o batuque do tambor marca os passos dos pares, que arrastam os pés de um lado para o outro. Comunidades do litoral e do interior do Pará buscam, com diversas iniciativas, manter viva a tradição do carimbó, que pode ter mais de 200 anos de história. No ano de 2005, em debates promovidos durante o Festival de Carimbó de Santarém Novo, grupos e entidades paraenses iniciaram a campanha Carimbó Patrimônio Cultural Brasileiro, com o objetivo de mobilizar a sociedade para a valorização e o reconhecimento da expressão como importante elemento de identidade da cultura nacional. Após oito anos de ações, pesquisas e estudos, o processo de registro do carimbó como patrimônio cultural, junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan, está na fase final e a expectativa é que seja concretizado em 2014.
Mais que um estilo de música, no Pará, o carimbó representa um modo de vida que é transmitido oralmente pelos mestres e membros dos grupos. Segundo Isaac Loureiro, coordenador da campanha Carimbó Patrimônio Cultural Brasileiro e membro da Irmandade de Carimbó de São Benedito, existem diversos debates sobre a origem do carimbó. Contudo, para os grupos, o importante é a síntese da expressão cultural, que eles acreditam ter sido formada por índios, negros e ibéricos. “O carimbó traduz a nossa memória e a tradição que mantemos vivas nas comunidades. São músicas dos séculos 18 e 19, que conseguem afirmar identidade e que ainda espantam as pessoas, porque muitas acham que não deveriam mais existir. Mas, continuamos celebrando o trabalho e a vida com festa, cantando a natureza, o mundo em que vivemos, afirmando valores de solidariedade, de respeito mútuo e de cooperação”, conta.
O carimbó está vinculado aos moradores do interior do Pará, ao ofício dos pescadores, ribeirinhos e agricultores. De acordo com Loureiro, as comunidades se esforçam para preservar a tradição e passar os conhecimentos para as novas gerações. O coordenador da campanha ainda relata que na cidade de Santarém Novo, por exemplo, o carimbó é exaltado com 11 dias de festa comunitária. “O festeiro oferece comida e bebida de graça e, para ele, essa é a maior alegria do mundo. A família se prepara durante o ano todo para, no final, gastar tudo em uma festa e ele fica muito feliz de ter feito isso. São valores fundamentais para nós, um modo de vida que está se perdendo cada vez mais, que vem das comunidades e tem contato direito com a natureza, com a terra e com as pessoas que valorizam aquilo que é mais essencial, o ser e não o ter”, disse.
A campanha Carimbó Patrimônio Cultural Brasileiro foi criada pelo anseio do reconhecimento e utilizou a afirmação como estratégia para disseminar informações sobre o carimbó e reduzir preconceitos. “Elaboramos um movimento, organizado pelos grupos e mestres de carimbo, para buscar o registro oficial [do Iphan] e para mobilizar a sociedade em torno da importância do tema. Para nós, não adianta apenas ter o título e somente o governo reconhecer, é preciso que a sociedade também reconheça e compreenda o valor dessa manifestação e desse patrimônio. A campanha cumpria um papel duplo de apresentar essa demanda para o governo e, também, por meio de várias ações, levar para as comunidades a compreensão sobre o que significa o registro do carimbó como patrimônio”, afirma Loureiro.
De acordo com a técnica em Antropologia, do setor de Patrimônio Imaterial da superintendência do Iphan do Pará, Larissa Guimarães, o processo para o registro do carimbó como Patrimônio Cultural Brasileiro foi iniciado em 2006, com a formalização do pedido junto à presidência do Iphan. “No caso do carimbó, o pedido foi oficializado por meio da Irmandade de Carimbó de São Benedito, junto com outros grupos. A partir disso, foi dado todo o trâmite e a abertura do processo, em dezembro de 2008, e a pesquisa foi iniciada com a realização do Inventário Nacional de Referências Culturais – INRC. Esse inventário começou com um levantamento preliminar e as etapas subsequentes de identificação e documentação seguiram, desde então, até 2013. O registro ainda não saiu, está na fase final, que é a elaboração do dossiê. Há uma previsão de registro no ano de 2014, mas o prazo está aberto”, explica.
O carimbó já é registrado pelo estado do Pará como Patrimônio Imaterial, e, segundo Guimarães, com o reconhecimento nacional, o Ministério da Cultura, por meio do Iphan, deve desenvolver uma série de políticas para salvaguardar o bem. “Um dos pontos principais desse reconhecimento do Iphan é proporcionar políticas de salvaguarda. As iniciativas que serão trabalhadas, a partir do registro, têm como foco principal a valorização dos grupos e dos mestres de carimbó. O trabalho que fazemos não é o de delimitar o que é o carimbó e nem de definir o que seria, mas registramos como ele é referenciado pelos seus detentores, as pessoas que vivenciam de fato o carimbó e fazem os instrumentos, as carimbolas, maracas e flautas”, elucida.
O mestre do Grupo Uirapuru, Manuel Farias Pinto, conta que há um compromisso para preservar a cultura do carimbó e passar todo o conhecimento. “Aprendemos a respeitar os mestres que já se foram e os que estão vivos até hoje, em idade avançada. Hoje, pra mim, é uma grande honra ser mestre, temos mais de 45 grupos de carimbó na cidade [de Marapanim]. Buscamos trabalhar com esse pessoal para que nossa cultura possa viver durante muitos anos e queremos esse registro porque ele irá garantir que a nossa cultura tenha mais respeito, para que os mestres sejam valorizados nos seus tratados, para que eles possam ter a função e o conhecimento deles passados nas escolas, para os alunos”.
O mestre explica que o carimbó emite um som forte e envolvente, que mantém as suas origens na natureza e, por esse motivo, transmite uma cultura de raiz. “As músicas são feitas quando estamos pescando, trabalhando, pela cantiga de um pássaro voando, pelo jogar da maresia, do barco, da linha. Essa criação nasce da labuta, quando surge a inspiração do dia. A universidade ajuda no conhecimento, na sabedoria, mas o mestre não precisa passar pela universidade para fazer uma música, ele já traz isso dentro dele. Para uma criança de dois ou três anos bater o carimbó no ritmo, pegar a maracá e tocar, isso já vem no sangue, foi dado pela natureza. O carimbó é uma expressão forte que contagia e mexe com as pessoas, porque vem do tronco da árvore, do índio e do caboclo”, diz o mestre Manuel Farias Pinto.
Pamella Indaiá/Blog Acesso
Mais que um estilo de música, no Pará, o carimbó representa um modo de vida que é transmitido oralmente pelos mestres e membros dos grupos. Segundo Isaac Loureiro, coordenador da campanha Carimbó Patrimônio Cultural Brasileiro e membro da Irmandade de Carimbó de São Benedito, existem diversos debates sobre a origem do carimbó. Contudo, para os grupos, o importante é a síntese da expressão cultural, que eles acreditam ter sido formada por índios, negros e ibéricos. “O carimbó traduz a nossa memória e a tradição que mantemos vivas nas comunidades. São músicas dos séculos 18 e 19, que conseguem afirmar identidade e que ainda espantam as pessoas, porque muitas acham que não deveriam mais existir. Mas, continuamos celebrando o trabalho e a vida com festa, cantando a natureza, o mundo em que vivemos, afirmando valores de solidariedade, de respeito mútuo e de cooperação”, conta.
O carimbó está vinculado aos moradores do interior do Pará, ao ofício dos pescadores, ribeirinhos e agricultores. De acordo com Loureiro, as comunidades se esforçam para preservar a tradição e passar os conhecimentos para as novas gerações. O coordenador da campanha ainda relata que na cidade de Santarém Novo, por exemplo, o carimbó é exaltado com 11 dias de festa comunitária. “O festeiro oferece comida e bebida de graça e, para ele, essa é a maior alegria do mundo. A família se prepara durante o ano todo para, no final, gastar tudo em uma festa e ele fica muito feliz de ter feito isso. São valores fundamentais para nós, um modo de vida que está se perdendo cada vez mais, que vem das comunidades e tem contato direito com a natureza, com a terra e com as pessoas que valorizam aquilo que é mais essencial, o ser e não o ter”, disse.
A campanha Carimbó Patrimônio Cultural Brasileiro foi criada pelo anseio do reconhecimento e utilizou a afirmação como estratégia para disseminar informações sobre o carimbó e reduzir preconceitos. “Elaboramos um movimento, organizado pelos grupos e mestres de carimbo, para buscar o registro oficial [do Iphan] e para mobilizar a sociedade em torno da importância do tema. Para nós, não adianta apenas ter o título e somente o governo reconhecer, é preciso que a sociedade também reconheça e compreenda o valor dessa manifestação e desse patrimônio. A campanha cumpria um papel duplo de apresentar essa demanda para o governo e, também, por meio de várias ações, levar para as comunidades a compreensão sobre o que significa o registro do carimbó como patrimônio”, afirma Loureiro.
De acordo com a técnica em Antropologia, do setor de Patrimônio Imaterial da superintendência do Iphan do Pará, Larissa Guimarães, o processo para o registro do carimbó como Patrimônio Cultural Brasileiro foi iniciado em 2006, com a formalização do pedido junto à presidência do Iphan. “No caso do carimbó, o pedido foi oficializado por meio da Irmandade de Carimbó de São Benedito, junto com outros grupos. A partir disso, foi dado todo o trâmite e a abertura do processo, em dezembro de 2008, e a pesquisa foi iniciada com a realização do Inventário Nacional de Referências Culturais – INRC. Esse inventário começou com um levantamento preliminar e as etapas subsequentes de identificação e documentação seguiram, desde então, até 2013. O registro ainda não saiu, está na fase final, que é a elaboração do dossiê. Há uma previsão de registro no ano de 2014, mas o prazo está aberto”, explica.
O carimbó já é registrado pelo estado do Pará como Patrimônio Imaterial, e, segundo Guimarães, com o reconhecimento nacional, o Ministério da Cultura, por meio do Iphan, deve desenvolver uma série de políticas para salvaguardar o bem. “Um dos pontos principais desse reconhecimento do Iphan é proporcionar políticas de salvaguarda. As iniciativas que serão trabalhadas, a partir do registro, têm como foco principal a valorização dos grupos e dos mestres de carimbó. O trabalho que fazemos não é o de delimitar o que é o carimbó e nem de definir o que seria, mas registramos como ele é referenciado pelos seus detentores, as pessoas que vivenciam de fato o carimbó e fazem os instrumentos, as carimbolas, maracas e flautas”, elucida.
O mestre do Grupo Uirapuru, Manuel Farias Pinto, conta que há um compromisso para preservar a cultura do carimbó e passar todo o conhecimento. “Aprendemos a respeitar os mestres que já se foram e os que estão vivos até hoje, em idade avançada. Hoje, pra mim, é uma grande honra ser mestre, temos mais de 45 grupos de carimbó na cidade [de Marapanim]. Buscamos trabalhar com esse pessoal para que nossa cultura possa viver durante muitos anos e queremos esse registro porque ele irá garantir que a nossa cultura tenha mais respeito, para que os mestres sejam valorizados nos seus tratados, para que eles possam ter a função e o conhecimento deles passados nas escolas, para os alunos”.
O mestre explica que o carimbó emite um som forte e envolvente, que mantém as suas origens na natureza e, por esse motivo, transmite uma cultura de raiz. “As músicas são feitas quando estamos pescando, trabalhando, pela cantiga de um pássaro voando, pelo jogar da maresia, do barco, da linha. Essa criação nasce da labuta, quando surge a inspiração do dia. A universidade ajuda no conhecimento, na sabedoria, mas o mestre não precisa passar pela universidade para fazer uma música, ele já traz isso dentro dele. Para uma criança de dois ou três anos bater o carimbó no ritmo, pegar a maracá e tocar, isso já vem no sangue, foi dado pela natureza. O carimbó é uma expressão forte que contagia e mexe com as pessoas, porque vem do tronco da árvore, do índio e do caboclo”, diz o mestre Manuel Farias Pinto.
Pamella Indaiá/Blog Acesso
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